BlogsCulturaExclusivasNotícias

Amado Jorge

Foto: Reprodução/Editora Todavia

Quero apenas contar algumas coisas, umas divertidas, outras melancólicas, iguais à vida.
A vida, ai, quão breve navegação de cabotagem!

Jorge Amado

Ei Clio: – Perdoe-me! Hoje minhas palavras serão laudatórias. Manejarei o teclado, na intenção de saudar um homem imenso. Lembrando que na imensidão cabem muitas outras coisas.

O filho de D. Eulália, mais conhecida como Lalu, nasceria, segundo a lenda: “empelicado”, fenômeno raro entre os que chegam por aqui; nestes partos, os médicos usam uma pinça para estourar a bolsa amniótica que protege o bebê durante a gestação, já que este vem para o mundo dentro da bolsa intacta. Em torno da figura do Amado Jorge, já se vislumbrava, segundo as tradições populares, um futuro brilhante. Se sua condição de menino “empelicado” teve ou não influência no que viria, deixemos às especulações metafísicas.

Ao que tudo indica, esse homem que faria hoje 110 anos, moveu-se por paixão pelas palavras. Cabe lembrar, que no início de sua carreira, lançava um livro por ano, o que nos aponta a fome de sua escrita.
Jorge viu e viveu a Bahia como ninguém. Ateu e amante do candomblé, soube engendrar suas histórias nos apontando um Brasil profundo, embebido pelas tradições africanas. Só um hábil conhecedor do povo, poderia escrever Capitães da Areia.

Como tal vida não caberia só na escrita dos romances, fez também da política, um modo de lutar pelas ideias nas quais acreditava. Eis o PCB (Partido Comunista Brasileiro).

Jorge Amado em Paris, 1948. Crédito: Acervo Fundação Casa de Jorge Amado

Resultado de sua viagem à antiga União Soviética, Jorge trouxe ao público brasileiro o raríssimo O mundo da paz. Coloco aqui como obra rara, pois há muito não é reeditado. Neste livro o autor nos mostra, através de uma espécie de relato de viagem, o modo de vida do povo, retrata a educação e a cultura entre os soviéticos no conturbado século XX. Uma obra prima. Vale a pena ler.

Entre os seus escritos com proeminente orientação política, temos ainda, a trilogia: Subterrâneos da Liberdade. Nela, o autor caminha criticamente pelo turbulento período do Estado Novo no país. Recomendo a leitura!

Como em Jorge cabem milhões, é dele também o inesquecível: ABC de Castro Alves. Como se estivesse sentado no banco de uma praça, Amado conta a uma amiga a história do poeta baiano. Com frases emblemáticas, como: “Castro Alves lutava para que os outros, milhares de desgraçados que nem tinham nome, subissem e conquistassem um lugar eles também”, o leitor se percebe enredado pela trama. Escrito em 1941, portanto, no calor da juventude, nosso autor também teceria nessa biografia, umas críticas, ao meu ver, injustas ao nosso Machado de Assis…Epa…este texto é laudatório…eu já ia me esquecendo.

Em 2018, Josélia Aguiar nos trouxe, fruto de sua robusta pesquisa: Jorge Amado – Uma biografia. O livro traz os recortes de uma existência intensa e apaixonada. Nosso Jorge ganhou o mundo e, porque não dizer que o mundo ganhou nosso Jorge?

Hoje o Brasil está cinza, meu bom baiano! Seguimos roucos demais para gritar, bestializados e, ainda decifrando o que há por vir.

No entanto, Amado Jorge, suas palavras seguem agitando os coqueiros de Itapuã, aliviando nosso cansaço e nos convocando para outras manhãs.

Juliana Gobbe