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O amor internético é platônico ou neoliberal?

Juliana Gobbe

Não esperem que eu traga resposta, talvez aponte dúvidas maiores sobre a pergunta acima. Quem sabe algum tipo de reflexão? Provocação? Ah…essa certamente.

No Banquete de Platão, especificamente no tópico: “O desejo de imortalidade” após o exuberante diálogo entre Sócrates e Diotima, temos a seguinte passagem:

“Todo aquele que deseja atingir essa meta ideal, praticando acertadamente o amor, deve começar em sua mocidade por dirigir a atenção para os belos corpos. Mais adiante: “Mas, a seguir, deve observar que a beleza existente num determinado corpo é irmã da beleza que existe em outro – e que se deve procurar a beleza da forma, seria grande mostra de insensatez não considerar como sendo uma única e mesma coisa a beleza que se encontra em todos os corpos. Em seguida, considerará a beleza das almas como muito mais amável do que a dos corpos”…

E aqui começamos a problematizar a referida passagem, colocando a no contexto das redes sociais em tempos neoliberais. A chamada second life ganha cada vez mais adeptos. Por trás dos belos filtros, escondemos o que decidiram ser nossas imperfeições. As relações são opacas e esmaecidas de vínculo e contato físico. O pesquisador Danilo Patzdorf no seu trabalho de relevo, intitulado: Artista-educa-dor: a somatopolítica neoliberal e a crise da sensibilidade do corpo ocidenta(lizado) trabalha com as questões do corpo adoecido, num sistema que empobrece os sentidos e as redes de afeto. Trago também o trabalho do pesquisador Heribaldo Maia que estuda o sofrimento psíquico nas universidades brasileiras sob a égide do neoliberalismo. Maia, analisa a pressão vivida por discentes e docentes nos processos formativos. Os chicotes do nosso modo de produção são implacáveis no desinteresse e extermínio de corpos marcados para a morte prematura.

Há amor no capitalismo? Como se dá? Vive ou se esconde debaixo das ruínas do medo?

Será que ainda gostamos de gente ou do que nos é mostrado pelas redes sociais?

Essa vida plana e previsível não estaria nos roubando os amores possíveis em suas contradições reais?

Se Platão trabalhava com o ideal, talvez a falha contemporânea seja o pretender viver o real e não consegui-lo de modo satisfatório. Sempre mediados pelas ingerências dos que querem tragar e moer nossas vidas nas máquinas da produtividade. Não caiamos no calabouço do identitarismo, tampouco nos esqueçamos de abraçar a realidade trazendo o afeto também para as lutas, e como já preconizava nossa Rosa Luxemburgo, que possamos viver num mundo “onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”. Antes que seja tarde.

Juliana Gobbe é Doutoranda em Filosofia e História da Educação pela Unicamp. Autora de Óculos de Marfim e À esquerda do Império (2017). Coordena o blogue “Tecendo em Reverso” e o coletivos Abraço Cultural e Kalúnia.